Ilustração: Árvore da arquitetura de Sir Banister Fletcher, publicada em “A history of architecture on the comparative method” 16ª edição, 1954. Debaixo à esquerda, recorte de “Los leñadores”, Goya 1777-1780, Museu do Prado, Madrid.
“Drop your pencil, study Brunelleschi, and load your Molotovs”
Esta é a frase que Mario Carpo1 utiliza para descrever a área de história e teoria da arquitetura como espaço de resistência, que se enfrentava nos anos sessenta à deriva estilística dos grandes projetos associados a empresas e fortunas do mundo anglo-saxónico. Embora a situação persista, hoje em dia a área de história está em retrocesso na maior parte das escolas de arquitetura do mundo. Aceitamos sem pestanejar que as novas tecnologias afastem as matérias que são vistas como “de apoio” ao “trabalho do arquiteto”2. O problema torna-se ainda mais evidente nas licenciaturas norte-americanas de três anos, nas quais os estudantes apenas recebem uma ou duas disciplinas de história que comprimem uma revisão desde a antiguidade até ao séc. XX, e nada mais.3
Enquanto os professores de história veem o seu campo de ação reduzido, os desafios culturais, institucionais e sociais que se podem enfrentar a partir da formação do arquiteto não param de aumentar. O mundo contemporâneo, cada vez mais interligado e complexo, exige a expansão da cultura histórica associada à arquitetura e a transcendência da breve revisão com a qual continuam a operar a maioria dos programas. A tarefa de sensibilizar os estudantes em relação à história, que já de por si não é tarefa fácil, é ainda mais complicada quando de questiona a árvore genealógica da arquitetura e se tenta escapar das abordagens lineais eurocentristas presentes na “Grécia”, depois em “Roma”, e, também, no “Renascimento”.4
Como este é um problema global e não existe nenhuma solução simples, alguns professores começaram a associar-se em redes como a Global Architectural History Teaching Initiative (GAHTC), fundada em MIT por Mark Jarzombek e Vikramaditya Prakash5. O debate dentro destes grupos é intenso. Cortar a árvore da arquitetura é uma grande aventura porque, ao mesmo tempo que se abandona a história “correta”, entra-se em territórios sobre os quais não há referentes. Se um arquiteto do séc. XX conhece a catedral de Florença, mas desconhece o templo budista de Borobudur, é algo perfeitamente normal. Se um arquiteto do séc. XX conhece este último, mas desconhece o primeiro, é algo polémico. Claro está que o ideal seria que conhecesse ambos, mas a realidade é que o conteúdo das disciplinas não dá para mais.
Uma das poucas concordâncias nesta discussão é que a história global da arquitetura fala de processos, não de produtos. Procura os espaços de contaminação, esses onde as categorias tradicionais não funcionam. Sob o seu ponto de vista, os edifícios não são construções de tal estilo acabadas entre tal e tal ano, mas superposições centenárias de técnicas, sensibilidades e saberes. Cada planta, alçado e detalhe construtivo está associado a redes de relações globais possíveis de desenhar. As pequenas nuances sobre como pôr em prática uma teoria assim continuam a não ser claras, mas trabalhamos com a convicção de que esta sensibilidade, também existente noutras ramas da história, possibilitará superar o panorama de etiquetas, estilos e marcas nacionais sob o quais a arquitetura continua a ser apresentada.
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Texto traduzido por Inês Veiga