Vamos imaginar um espaço para a infância. Vamos imaginar, além disso, que até está bem projetado. A memória do projeto explica que, para a sua elaboração, contou-se com a participação de crianças, incorporando as suas ideias e opiniões. No entanto, as imagens só mostram o resultado. Quais foram as atividades realizadas? Que desafios é que implica a participação dos mais pequenos ao projetar edifícios e espaços urbanos?
As crianças são cidadãos de pleno direito. Assim está escrito na Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança (1990), que inclui no artigo 12 que “a criança com capacidade de discernimento tem o direito de exprimir livremente a sua opinião sobre as questões que lhe respeitem”.1
No entanto, a participação infantil é um âmbito experimental que possui características particulares:
- Está intimamente ligada à educação. As metodologias mais eficazes surgem de aproximações pedagógicas2 e, portanto, requerem especialistas capazes de aplicar diferentes técnicas e oferecer ferramentas criativas e variadas de design para que cada participante se possa expressar. O objetivo final é garantir que as contribuições das crianças sejam compreendidas e evitar que a sua participação seja uma mera forma de publicidade do projeto ou, como acontece em muitos casos, não seja levada a sério.
- Requer métodos indiretos. A autora Susan Solomon adverte sobre o fracasso de projetos de Playgrounds quando se pergunta diretamente aos participantes o que estes desejam, já que tendem a reproduzir o que conhecem com resultados pouco imaginativos. Face a esta técnica, valoriza alternativas como as implementadas por Roger Hart nas quais se formulam perguntas indiretas: o que é que gostariam de fazer, o que é que as assusta, o que é que as faz sentir confortáveis, etc. e onde se realiza uma observação minuciosa de como as crianças brincam e interagem.
- As crianças devem ser incluídas no processo como especialistas máximas em termos de necessidades de conforto, sociais e de diversão. É também essencial envolvê-las na fase de análise, de detetar desde o início as carências do espaço e gerar empatia com o resto das pessoas que o utilizarão.
- A escala do espaço a intervir. Segundo a opinião de Angela Million, as crianças são mais propensas a participar em espaços que lhes são familiares e que tem incidência na sua vida quotidiana, e o seu interesse diminui com escalas mais amplas. Este aspeto, unido à necessidade pedagógica do processo, transformou os pátios escolares num interessante campo a partir do qual, atualmente, se experimenta a participação desde a educação.
- O tempo necessário para desenvolver este processo. A participação em geral exige uma preparação e análise de resultados que muitas vezes não coincidem com prazos e horários. Isto faz com que, seguindo a escada de participação de Roger Hart, muitos processos se limitem a perguntar às crianças o que estas querem (por exemplo, através de um desenho), mas que acabam por não receber um feedback sobre como as suas ideias foram usadas e como se transformaram em princípios válidos para o projeto. Convém ressaltar que, sem esta segunda fase, as crianças não têm uma participação real, e a sua contribuição acaba por ficar num primeiro estágio ou manipulação.3 Por outro lado, o tempo que o projeto demora para se materializar normalmente causa um desinteresse e desânimo entre os mais jovens.
A riqueza que representa uma adequada participação infantil e juvenil, tanto para os espaços que a recebem como a nível educacional para os participantes, ainda está longe de ser uma realidade. Algumas das chaves podem ser a abordagem criativa, os tempos adequados, a observação e uma sólida base pedagógica, mas acima de tudo devemos começar com uma escuta atenta das crianças e com uma vontade firme, além do marketing que estes projetos implicam, de incorporar as suas contribuições.