“Morte por cálculos” – A Estrela Misteriosa – Hergé – 1952
Uma das minhas tradições de Natal favoritas é voltar à ETSA de Granada no período de entregas do projeto de fim de curso. As conversas nesta reunião geralmente giram à volta das habilidades requeridas no PFC consoante onde o apresentes. Neste sentido, resultam irónicas e, inclusive, engraçadas as confissões de arquitetos recém-titulados oriundos de modelos académicos estrangeiros. Daphe Cruz fala-nos, em Enlace Arquitectura – do México –, sobre a dureza da sua formação de “quatro ou cinco anos”. Se dizes isto na entrega do PFC de qualquer estabelecimento de ensino espanhol ganhas uma galheta e um #lerdo garantido. Não se pode comparar porque falamos de modelos completamente diferentes.
Primeiro porque o título de arquiteto em Espanha é um canudo diferente, que exige coisas diferentes. No Libro Blanco del Título de Grado de Arquitectura (ANECA 2015) especificam-se 62 aptidões necessárias para o estudante de arquitetura. Sessenta e duas, nem mais, nem menos. Há que provar que dominam todas, embora no final nos especializemos em apenas algumas delas. Entre estas, há algumas como “Eletromagnetismo” ou “Economia urbana”, que dificilmente se encontram nos programas de arquitetura estrangeiros, que normalmente reduzem as aptidões a 8 ou 10, muito mais generalizadas. Por outro lado, enquanto as aptidões do arquiteto em Espanha estão pensadas em função das atribuições legais, noutros lugares trabalham-se em função de campos mais gerais. São ideias incomparáveis, pois pertencem a categorias diferentes. Somos um bicho distinto.
Em segundo lugar, estudar Arquitetura em Espanha significa estudar o dobro do tempo. Em 2015 a Universidade de Granada classificava a arquitetura como o curso que os estudantes mais tempo demoravam a acabar, com uma média de duração de estudos de 9,35 anos, para concluir um programa de 5 anos. Hoje em dia, os mestrados habilitantes nascidos em Bolonha já são oficiais. Este requisito de ter um diploma de pós-graduação para poder exercer profissionalmente nada mais é que a prova flagrante de que os estudos do arquiteto em Espanha nunca foram um grau universitário como os demais. Somos um bicho maior, que demora mais tempo a crescer.
Isto significa que os arquitetos espanhóis ganham calo antes de sair à rua. Começamos a trabalhar com uma idade média muito maior do que a dos países onde o curso dura menos tempo ou onde a habilitação está ao cargo de entidades como a RIBA. Aos que dizem que a formação do arquiteto é melhor, eu digo que é mais dura e mais extensa. Os nossos estudantes não são melhores nem piores, simplesmente têm mais experiência, são mais velhos e mais maduros, o que não significa necessariamente que seja uma vantagem, já que consome mais tempo. Enquanto uns já levam meia década de vida profissional, outros acabam de sair da universidade. Passamos 4 anos mais na universidade que o resto de colegas internacionais e 9 mais que Le Corbusier.
Resumindo, somos bichos distintos, que demoram o dobro para crescer e que devem saber coisas que não lhes interessa para nada. Inexplicavelmente, ao final, a mescla parece sair bem. Que bichos mais raros…
Memórias de um estudante de arquitetura, por Daphne Cruz, arquiteta…mexicana?
Libro Blanco del Título de Grado de Arquitectura
Aptidões do arquiteto em Espanha
Características específicas de qualidade para os programas de pré-graduação em Arquitetura – Ministério de Educação de Colômbia.
Descrição da pré-graduação em arquitetura da Universidade de Los Andes, Colômbia.
Texto traduzido por Inês Veiga.