Fazer parte de uma das últimas gerações que teve de pintar na escola e uma das primeiras a começar a usar ferramentas paramétricas, dá-me uma certa perspetiva para lidar com esse tema.
Estou convencido de que há uma profunda desafeição entre a criação arquitetónica e as ferramentas que se usam nos seus processos e poucos se perguntam o porquê da mesma, ou se é sequer oportuno solucioná-la. Podemos ler nesta casa como Alex Duro1 é capaz de afirmar com plena rotundidade que a arquitetura é pensada com as mãos, mas também como Daniel Moyano2 arrisca quando diz que produzimos arquitetura com ferramentas que podiam muito bem permitir gerar uma informação muito mais rica, complexa e produtiva.
Nesta tessitura, custou-me mil anos de investigação para chegar a uma certa conclusão de que a razão deste quero mas não posso é muito simples. A chave era pensar nos processos de arquitetura como se fossem processos de programação…
Em programação, existem dois tipos de linguagem, a de alto nível (de abstração) que é usada pelos humanos porque podemos entendê-la e ajuda a projetar programas humanos; e a de baixo nível (de abstração), aquela entendida pela máquina e que contém as instruções para fazê-la funcionar. Geralmente são muito difíceis de ser entendidas pelos humanos e contêm instruções para os aparelhos muito, muito específicas.
Na arquitetura, poderíamos associar essa dualidade ao facto de que a documentação construtiva é a linguagem de baixo nível (de abstração). Contém instruções muito precisas para que a máquina (a construtora) execute a construção. A partir daqui, descobrimos que esta linguagem já foi portada para o digital de uma forma altamente eficaz nos suportes BIM.
Mas… então quais são os sistemas de alto nível (de abstração) na arquitetura? Por agora, para mim e para muitos colegas, continua a ser o esboço a lápis, a maquete de trabalho e, acima de tudo, a cabeça.
Por que não existem ferramentas digitais de alto nível (de abstração) como existem na programação?
Ora bem, é um tema ao qual dedico muito tempo, há anos, mas que não sabia como questionar com esta clareza. As minhas respostas (provisórias) são várias…
Que continuamos a lidar com a tecnologia do baixo ao alto nível e que isso não incorpora abstração… Muitos de vocês não gostam nem sequer da ideia de usar o BIM para um anteprojeto. Desenhar um espaço e que apareçam as layers de um paramento dá arrepios e é normal…
Que trabalhar com o espaço, que para mim é a matéria prima da arquitetura, é terrivelmente abstrato, e, por isso, muito difícil de manipular. É mais fácil desenhar e encapsular nesse ato todo o nosso conhecimento sobre esse espaço que tratar de o transformar em informação para que os PCs os possas computar…
Que não gostamos de perder o controlo. E aqui incido numa má interpretação. A grande maioria dos que rejeitam tudo o que está ligado à computação na arquitetura tem a ver com a automação e isto com delegar o controlo ou a autoria à máquina. E entendo o vosso medo porque existem muitas linhas de trabalho que vão nessa direção, mas o verdadeiro potencial, ainda pouco explorado, está em aumentar o nosso poder criativo e acima de tudo o nosso controlo sobre todo o processo entendido como uma sequência integral…
Se vos interessa este tema, aqui têm um breve resumo do estado atual da minha investigação.
Texto traduzido por Inês Veiga.