A origem da arquitetura é um tema que me interessa particularmente. Bom, na verdade a origem é um tema que me interessa particularmente. Qualquer manifestação artística define-se por uma interpretação da origem, desde o Neoclássico até às vanguardas dos anos 20, passando pelo punk.
Tive a sorte de poder debater este tema com duas pessoas diferentes. Simplificando o que não se pode simplificar: para Juan Domingo Santos a origem da arquitetura está no movimento de terras, na beleza das margens de pedra solta1 que permitem trabalhar a terra, ordená-la e torná-la produtiva. Para Juan Navarro Baldeweg, a origem da arquitetura está na Cabana Primitiva. Se sentássemos a ambos numa mesa para discutir a questão2 descobriríamos rapidamente que ambos opinam a mesma coisa, mas de maneira oposta. As margens de pedra solta são um artefacto estritamente funcional que a nossa visão transforma em algo representativo e belo. A Cabana Primitiva é um artefacto representativo que se torna funcional.
A representação destas duas tendências é perfeita para ser narrada, porque é tão radical (no sentido de narrar um começo) que pode ser entendida sem ser necessário ser arquiteto. É algo imanente à nossa cultura.
Esta dupla explicação simultânea, em constante mudança de ponto de vista, é a génese do programa Escala Humana, que será transmitido todas as quartas-feiras às 21h (horário espanhol) no canal 2 da TVE.
Como boa génese chegamos à metade da produção de um modo paralelo a essas arquiteturas que encontram a sua explicação definitiva quando já estão meio construídas, ou até mesmo uma vez acabadas.3 A organização da série é muito elementar: tínhamos temas e tínhamos histórias. Trabalhamo-los em singular e em paralelo, misturamo-los, resultando em programas temáticos baseados em contar histórias sobre intervenções arquitetónicas que lhes estejam relacionadas. Muitos temas, ou muitas histórias, perfeitamente intercambiáveis. Não só não nos importamos, mas consideramos isto como um sinal da complexidade desta arte, que admite múltiplas explicações, diferentes e simultâneas.
Os temas estão relacionados com esta dupla origem que antes comentei. Estávamos interessados no que tem a ver com a função, com o uso e com a manutenção de uma arquitetura que deveria tornar a vida mais agradável para todos: o verde, a sustentabilidade, a acessibilidade e assim por diante. O aspeto representativo também nos despertava interesse, o olhar que revela a beleza do que nos rodeia: os espaços industriais, os edifícios que muitos se derrubariam quando poderiam ser recuperados e reutilizados, ou aquelas construções que nos comovem. Esta dupla condição marcou o programa, e é da nossa explicita vontade estendê-la às paisagens urbanas (e, espero, rurais no futuro) que nos rodeiam.
Depois está a forma como se representa. Filmámo-lo (quase) tudo nós mesmo, para desta forma poder transmitir a nossa visão. Jaume Clèries realiza o programa. Nuria Moliner, arquiteta e investigadora, apresenta-o. Como também é músico, dotou o programa de uma banda sonora com o grupo Intana.
O olhar, o ritmo, a calidez. Esta é a nossa marca. Também o é a pluralidade.
A equipa é formada por muitas e diferentes pessoas, com diferentes interesses e opiniões. Isto deu-nos pontos de vista, orientações, jogos de equilíbrio, modos de ver, de narrar, de escrever diferentes. Apenas o que acontece, ou o que teria que acontecer, numa revista de arquitetura. Esta lógica também está aí.
O trabalho está quase terminado. Agora só resta mostrá-lo. Esperamos que vos interesse.