Nós, os arquitetos, temos peculiaridades, não o podemos negar.
A nossa educação e uma certa “cultura de profissão” manifestam-se frequentemente sob forma de rasgos concretos muito arraigados. Alguns deles prejudicam-nos. Vão contra a nossa produtividade e, inclusive, do nosso bem-estar.
Esclareço que este post é o resultado de uma observação nada científica e provavelmente tendenciosa, baseada na gama de amostras profissionais e estudos aos que tenho acesso, que é mais ou menos amplo.
Total, se não te sentes identificado com algumas destas características, não quer dizer que sejas menos arquiteto que outros, simplesmente que tens um problema menos. J
O heroísmo
Esta é um clássico. Há uma espécie de romanticismo no deixar gotas do teu sangue entre as pedras de cada obra, qual muro de Foceia, mas esta não é uma maneira de viver sustentável. Se prejudicas a tua saúde, acabarás por ser incapaz de trabalhar.
O costume (por vezes celebrado) de acabar as coisas à força, com sacrifício e privação de sono, já curtida nas entregas do curso, pode ser substituído por uma melhoria na efetividade e por um respeito pelo próprio organismo e pelos colaboradores.
Excesso de perfeccionismo
Os projetos nunca se acabam. Há sempre alguma coisa que se pode melhorar, que se pode definir mais detalhadamente, ou talvez, uma vez esteja tudo acabado, tenhamos de voltar a imprimir os painéis do concurso para que esta ou aquela linha seja cinzenta.
Cada projeto tende a expandir-se até ocupar o limite de tempo disponível, e por vezes até superado esse limite. É necessário aprender a parar num nível razoável de perfeição e fugir da Falácia Nirvana.
Apreensão a delegar.
Foi-nos ensinado que devemos controlar todos e cada um dos aspetos do projeto de um edifício. Cada detalhe… desde a escala urbana até ao puxador da porta. Isso às vezes significa dominar tudo ao mesmo tempo, e acabar por não se conseguir ver nada.
Delegar, e saber fazê-lo, é muito mais efetivo e conduz a melhores resultados, mesmo que custe deixar a tua criação nas mãos de terceiros (que, ademais, podem ter talentos que tu não tens).
Assim dizia Johann Sebastian Bach. Se ele pôde e ninguém se atreve a dizer que as suas cantatas não são suas, todos nós podemos.
Não dizer “não”
Corolário do anterior. Ao querer controlar tudo, temos a tendência a encarregar-nos de tarefas que nem sequer têm nada a ver com o processo do projeto ou da construção de um edifício.
Numa estrutura estática, o barrote mais gordo é o que suporta a maior carga (Eduardo Torroja deve estar a dar voltas na tumba), e é isso que fazemos. É mais inteligente saber dizer “não” a certas coisas.
É puro artesanato.
Normalmente temos uma autêntica alergia à definição de processos ou à automatização de determinadas tarefas. Somos artesãos.
Instaurar e otimizar os processos de trabalho não anulará a nossa criatividade, não nos transformará em linhas de montagem, nem nos restringirá. Bem pelo contrário, fará com que as nossas qualidades sejam mais notórias.
A produtividade beneficia-nos.
E há mais, mas estou a ficar sem espaço e não é necessário autoflagelar-se.
Acredito que o panorama esteja a mudar e cada vez mais, embora lentamente, somos mais conscientes de que a produtividade é importante para conseguir um melhor resultado profissional e para o nosso próprio bem-estar.
E até para competir, seja entre nós, seja com outras profissões que nos devoram certas competências ou com os atores de outros mercados, como é o caso do internacional.
E tudo isto sem perder as nossas melhores qualidades criativas.
Tal como Bach, que além de génio, foi incrivelmente produtivo.
Imagem: Foto de © Kelly Sikkema em Unsplash
Texto traduzido por Inês Veiga