IF HOUSE _ Vicente Iborra + Iván Capdevila (PLAYstudio)
Voltou a acontecer. Desta vez foi uma antena colocada conforme as lógicas da telecomunicação, mas longe das da composição arquitetónica que muitos de nós continuamos a reproduzir automaticamente. Porque é que dita imagem produz tanto desconforto? A propósito, este texto contém mais perguntas do que respostas.
O comum, nos seus múltiplos significados – o quotidiano, o banal, o encontrado «como estava», o existente – tem sido celebrado por muitos de nós, os arquitetos, há muitas décadas. Vêm-nos à cabeça textos de Robert Venturi e Denise Scott Brown, de Rem Koolhaas, dos Smithsons … De facto, em 2010, Enrique Walker reuniu muitos deles num livro que se intitulou precisamente assim. No entanto, muitos destes casos – já históricos –, bem como outros mais recentes no nosso contexto nacional, apropriam-se de forma unilateral, e até certo ponto elitista, deste conceito. Hoje em dia, o ordinário entendido como manifestação quotidiana da sociedade – nas suas múltiplas facetas – tornou-se um recurso habitual de certos discursos amplamente reconhecidos e promovidos por um sector da crítica arquitetónica. Mas o que têm de realmente ordinário estes produtos arquitetónicos? Quando o Archigram – prefiro evitar dar exemplos mais próximos – realizava os seus collages a partir de imagens da cultura popular era pouco o que desta restava: a subjetividade do arquiteto anulava praticamente a do suposto utilizador. Os produtos finais eram altamente sofisticados e acessíveis apenas por um público cultivado arquitetonicamente. De facto, estes produtos baseados no quotidiano realizam-se, tanto antes como agora, em salas de exposições e publicações especializadas muito distantes da sua origem.
Podemos, então, continuar a falar do ordinário na arquitetura?
Paralelamente e num âmbito mais geral e inclusivo, o Google Images ou o Pinterest possibilitam – empoderam – que os potenciais clientes expressem os seus desejos mais profundos através de imagens. O maravilhoso mundo das imagens, até há tão pouco tempo restringido aos especialistas, democratizou-se. Tal como Jelena Prokopljevic abordava no seu artigo, estas plataformas podem estar a habilitar uma nova ideologia ao fornecer “uma série de imagens e conceitos com os quais um grupo social se possa identificar.” Tornam-se, pouco a pouco, ferramentas de comunicação entre os arquitetos e ‘os outros’. Noutras palavras, tornam-se ferramentas instituintes do ordinário como grande paradigma. Tal como o desconforto que nos produz a antenas, produz-nos também a cor das paredes ou a inclusão dessa mesa camila ou daquelas cortinas opacas de flores que cobrem a bela janela a 90º. Tanto esforço para eliminar o pilar da esquina para acabar desta maneira – não podemos ignorar a reprimenda que Mies van der Rohe deu a Philip Johnson na sua Casa de Cristal. Chega, então a controvérsia: trazemos um caminhão cheio de móveis “adequados” para tirar as fotografias? Até que ponto a arquitetura, se for benfeita, pode sobreviver ao impacto da subjetividade ordinária? Ou melhor, porventura não deve a arquitetura coexistir sem complexos com as decisões dos seus habitantes? O que aconteceria se renunciássemos aos padrões impostos por certas revistas de arquitetura ou por certa crítica e mostrássemos a «Realidade» da nossa arquitetura face ao que é autenticamente comum? Talvez, como diz Carlos Santamarina-Macho, “sejam estas ruturas do convencional (…) que tornam qualquer simples e monótona habitação num lar, pessoal e único.”
Em breve saberemos. Enquanto isso, estou em processo de aceitação.
Quero ser #superordinario
Texto traduzido por Inês Veiga.